CANÇÕESQUE FALAM POR NÓS 3. EU QUERO BOTAR MEU BLOCO NA RUA: Por Rui Leitao
CANÇÕESQUE FALAM POR NÓS 3. EU QUERO BOTAR MEU BLOCO NA RUA: Por Rui Leitao
O letrista e compositor dessa marcha-rancho que fez enorme sucesso em 1972, no IV Festival Internacional da Canção, desapareceu do cenário artístico precocemente. O capixaba Sérgio Sampaio era muito ligado a Raul Seixas, que inclusive produziu o disco que levou o nome título dessa música. “Eu quero é botar meu bloco na rua” faz parte de várias expressões musicais da era dos protestos à ditadura militar então vigente.
É uma exortação à ida do povo às ruas para se manifestar contra o regime autoritário que se instalara no país. “Há quem diga que eu dormi de touca/que eu perdi a boca/que eu fugi da briga/que eu caí do galho e não vi saída/que eu morri de medo quando o pau quebrou”. Era o desapontamento com a aparente passividade do povo brasileiro. Os ditadores imaginavam que todos nós “dormíamos de touca”, estávamos sem capacidade de reação, sem querer acordar para a realidade. Acreditavam que desde o AI-5, após as agitações de rua ocorridas em 1968, teríamos enfim nos determinado a “fugir da briga”, baixar as bandeiras de luta.
Acreditavam que “morríamos de medo” da experiência traumática do “pau quebrando”, quando dos protestos e passeatas dispersadas pela brutalidade da polícia. “Há quem diga que eu não sei de nada/que eu não sou de nada e não peço desculpas/que eu não tenho culpa, mas que dei bobeira/e que Durango Kid quase me pegou”. Continua Sérgio Sampaio chamando a atenção para a confiança do governo de que nós vivíamos uma situação de alienação, sem querer saber de nada, nem se importar em querer saber. Que admitíamos a nossa impotência para reagir. Usa da metáfora para dizer que “ao dar bobeira”, quase foi pego por Durango Kid, que simbolizava a polícia. Queria dizer que quando procurávamos sair da indolência, éramos pegos como infratores da ordem pública/social. “Eu, por mim, queria isso e aquilo/um quilo mais daquilo, um grilo menos disso/É disso que eu preciso ou não é nada disso/eu quero é todo mundo nesse carnaval”. A iniciativa de dizer o que queria, gritar suas reivindicações, exigir seus direitos.
O chamamento a que todos entrem “nesse carnaval”. O povo na rua, “todo mundo nesse carnaval”, numa só vontade, vivendo a mesma fantasia. “Eu quero é botar meu bloco na rua/brincar, botar pra gemer/ gingar, pra dar e vender”. Sérgio Sampaio usa a brincadeira e a alegria do carnaval para dizer que é preciso colocar “o bloco na rua”. Sair de casa e novamente cantar palavras de ordem, na busca da reconquista da liberdade que nos havia sido subtraída pelo golpe de 1964. Bom refletirmos que o momento de colocar “o bloco na rua” não é só por ocasião de uma ditadura militar, mas também quando é preciso demonstrar insatisfação contra governos que traem a confiança do povo e se comportam com despotismo e com práticas de corrupção. Essa música tem mais de quarenta anos, mas a conclamação de ir às ruas nunca perde a atualidade, mudam apenas as circunstâncias.
www.reporteriedoferreira.com.br Por Rui Leitao- Jornalista, Advogado e Escritor.