A GUERRA MORAL QUE CONQUISTA OS VULNERÁVEIS; Rui Leitao
A GUERRA MORAL QUE CONQUISTA OS VULNERÁVEIS; Rui Leitao
Não há como evitar o questionamento sobre um fenômeno político que tem se intensificado nos últimos anos: por que tantas pessoas pertencentes às camadas sociais de baixo poder aquisitivo aderem a pautas da extrema direita? O sociólogo Jessé Souza, em seu livro “Pobre de Direita – A Vingança dos Bastardos”, busca explicar esse irracionalismo coletivo que promove uma identificação afetiva com líderes extremistas, facilitada pela forma eficaz com que esses atores conquistam adesões. Entre os fatores, destaca-se a influência de doutrinas religiosas neopentecostais e o ressentimento que permeia boa parte da sociedade brasileira.
Ainda que sejam prejudicados pela prática política da direita, esses que passaram a ser classificados como “pobres de direita” resultam de uma guerra moral e de um ambiente de desinformação que estimula o negacionismo, a anticiência e reforça posturas conservadoras. A teologia da prosperidade, forte em muitas igrejas neopentecostais, tem impacto direto nessa adesão à ideologia conservadora ao pregar que o sucesso material é sinal do favor divino, reforçando a crença na meritocracia. Assim, uma parcela das classes populares admite votar contra seus próprios interesses, fazendo escolhas frequentemente inconscientes, impulsionadas por valores retrógrados, identidades forjadas e medos cuidadosamente alimentados.
Mesmo vivendo em condições econômicas adversas, muitos preferem apostar nos discursos da elite que exaltam a meritocracia e um nacionalismo ingênuo, em desfavor da democracia e da própria pátria. Tornam-se, desse modo, vítimas de um “colonialismo mental” que se espelha em sociedades estrangeiras muito distintas da nossa realidade. Prevalece a cultura da subserviência, do sentimento de inferioridade e do conformismo diante da situação vivida, acompanhada do temor diante de qualquer proposta de vanguarda.
O “pobre de direita” se comporta assim porque foi facilmente contaminado por pregações ideológicas que servem aos interesses das classes dominantes, sem desenvolver a preocupação em ampliar seus conhecimentos de mundo — algo que lhe permitiria exercer uma visão crítica da realidade e contribuir efetivamente para práticas progressistas voltadas à solução de seus próprios problemas. Age sob uma lógica contraditória, guiada por valores conservadores e moralistas, mesmo que isso prejudique a melhoria de suas condições de vida. A manipulação midiática reforça essa lógica ao produzir narrativas distorcidas que beneficiam apenas o topo da pirâmide social, promovendo a imagem de que a esquerda seria uma ameaça à moralidade, enquanto a direita se apresenta como salvadora da família e da ordem.
O bombardeio de desinformações tem o propósito de incutir nesse eleitorado uma percepção desviada das causas reais dos problemas sociais, levando-o a acreditar em realidades fictícias. Por isso, não percebe que políticas neoliberais precarizam o trabalho e desmontam a proteção social, mantendo milhões de brasileiros em permanente vulnerabilidade. Essa situação só poderá ser revertida quando tivermos uma política educacional capaz de abrir os olhos dessas pessoas, transformando a “raiva” à qual foram manipuladas a sentir em indignação consciente contra as políticas de opressão a que são historicamente submetidas.
Rui Leitão- advogado, jornalista, poeta, escritor



