Nonato Guedes
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está enredado em polêmicas internacionais como a que envolve as eleições presidenciais na Venezuela, decidiu voltar os olhos para a conjuntura brasileira que vive um período de eleições municipais e que assinala confronto entre partidos da base governista em inúmeras localidades do território nacional. Na reunião ministerial convocada para hoje, o tema das eleições deverá estar no radar, diante da preocupação do Planalto de que haja um alinhamento pacífico para o pleito, levando em conta que pelo menos parte dos dez partidos de apoio ao governo trava concorrência direta em cidades importantes. A reunião ministerial visa, também, combinar o que vai ser entregue após os cortes no orçamento, já que Lula ainda insatisfeito com o ritmo das entregas de obras de impacto.
Segundo relato do UOL, a reunião deve apontar para o futuro. Diferentemente do primeiro e único encontro neste ano, em março, quando cada ministro expôs as realizações da sua pasta, este encontro foca no que os gabinetes pretendem entregar até o fim do governo, em especial o anúncio do corte de R$ 25,9 bilhões na proposta de orçamento do exercício vindouro. Quanto ao ritmo das entregas, o presidente da República tem cobrado ministros por agilidade e menos anúncios de investimento, com maior resultado prático das realizações. Considerando que o segundo semestre de 2026 é eleitoral, o governo avalia que entrou nos últimos dois anos. Há a sensação de que, para a opinião pública, o terceiro governo de Lula não vem correspondendo em ações concretas, pautando-se mais por gestos simbólicos, nem sempre com repercussão popular. Já houve queixas de líderes petistas de que expoentes de outros partidos que estão na base não dão crédito ou publicidade ao governo Lula quando coordenam entregas nos Estados onde atuam. Este mandato de Lula constitui-se numa colcha de retalhos, por causa da variedade de apoios e alianças para compensar a falta de maioria do PT na Câmara dos Deputados e no Senado, o que é fator de dor de cabeça constante para o próprio mandatário.
Segundo fontes do Planalto, na reunião convocada para hoje, embora os ministros devam sinalizar para o futuro, o presidente deverá cobrar ações concretas. Tanto em reuniões como publicamente, o petista tem repetido que só se deve anunciar o que vai ser entregue. A pressa verificada em alguns episódios foi considerada frustrante para a sociedade e desgastante para o próprio governo, que teve de fazer um verdadeiro malabarismo para se justificar diante de promessas não cumpridas ou de entregas não concretizadas. No geral, a avaliação feita é que já está na hora de imprimir uma marca ao terceiro governo, inclusive, porque Lula tem notórias ambições de concorrer à reeleição em 2026. Até então, a gestão tem sido marcada pela reconstrução do legado desastroso deixado pelo governo de Jair Bolsonaro (PL), mas aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva já afirmam que falta ao terceiro mandato um rosto próprio, como foi o Bolsa Família no mandato anterior. A repetição de programas assistencialistas passa a impressão de que o governo do PT envelheceu e não tem mais propostas novas a oferecer à população.
As recentes pesquisas divulgadas por institutos especializados apontam oscilações percentuais no que diz respeito à aprovação ou desaprovação do governo Lula III. Os índices de aprovação são analisados como lentos ou insuficientes para oferecer à gestão um lastro de grande alcance popular que o credencie perante a própria História. O próprio roteiro de visitas de Lula a Estados tem sido escasso ou repetitivo na maioria das vezes – e isto se deve a que o governo não está tendo obras de vulto a proporcionar à sociedade. Por extensão, a receptividade a Lula em eventos públicos não chega a ser calorosa, a não ser por parte de remanescentes da militância petista engajada ou de representantes da “bolha” de esquerda que enxerga avanços econômicos e sociais por parte do governo, embora alguns desses avanços constituam miragem ou ilusão de ótica. A verdade é que o governo Lula III se apegou, demasiadamente, à denúncia da “herança maldita bolsonarista”, como tática para angariar apoio ou mesmo dispor de fôlego para preparar os resultados que iria ofertar. Só que nesse ínterim aconteceram problemas para aprovação parlamentar do arcabouço fiscal e da reforma tributária, o que levou à perda de tempo nas articulações políticas de bastidores e, por via de consequência, a uma certa inércia do Planalto no ritmo de execução de obras e serviços.
Lula deverá reforçar a necessidade de seguir a meta fiscal e apontar, junto à equipe econômica, que as pastas terão de se virar para seguir com investimentos sociais e de crescimento, mesmo com a redução de quase R$ 26 bilhões no orçamento. As respostas do governo tornam-se tanto mais urgentes em virtude das eleições para prefeitos, vice-prefeitos e vereadores em todo o país. Interessa ao Planalto, principalmente, o Raio X do pleito em algumas Capitais estratégicas como São Paulo, onde pela primeira vez o Partido dos Trabalhadores abriu mão de lançar candidatura própria e decidiu apoiar a candidatura do deputado federal Guilherme Boulos, do PSOL, tentando recriar a polarização lulismo versus bolsonarismo na Capital do Estado governado por Tarcísio de Freitas, ex-ministro do governo anterior. O PT dificilmente sairá consagrado dessas eleições, mas Lula espera que partidos aliados consigam vitórias que possam lhe dar cobertura na perspectiva de disputa do quarto mandato à Presidência da República lá na frente.