Remédio sugerido por Jair Bolsonaro é inútil contra o coronavírus e condenado pela Sociedade Brasileira de Infectologia
(Reuters) – O Ministério da Saúde afirmou nesta sexta-feira que avalia diariamente as novas evidências relativas ao uso da cloroquina no tratamento da Covid-19 e reconheceu que provavelmente mudará sua orientação atual, depois que a Sociedade Brasileira de Infectologia cobrou que os medicamentos sejam abandonados no tratamento de qualquer fase da doença.
“Estamos vendo quais são as evidências mais novas publicadas na literatura universal, então já somamos mais de 1 mil evidências em quase 70 boletins de evidências científicas, esses boletins são atualizados diariamente. E se mudará as orientações? Provavelmente sim. A ciência, ela muda dia após dia”, disse Hélio Angotti Neto, secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos do ministério, em entrevista coletiva.
Ele não detalhou qual tipo de mudança de orientação pode ser feita pelo ministério, mas disse que muitos artigos têm se posicionado contra o uso da cloroquina em pacientes em fase tardia da doença, quando “o vírus praticamente já não está mais presente” e a pessoa está sofrendo processos inflamatórios muito fortes.
“O ministério vai continuar acompanhando essas evidências diariamente e trazendo o melhor que se tem de informação atualizada. Se houver informação a favor, pode ser que uma nota informativa vire até uma orientação mais formalizada. Se vier uma orientação contra, pode ser que a nota informativa traga uma orientação diferente daquela que hoje se encontra. Da nossa parte não há problema nenhum em mudar a orientação”, acrescentou.
Atualmente, o Ministério da Saúde recomenda o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina para o tratamento da Covid-19 em todas as etapas da doença, apesar da falta de comprovação científica de eficácia.
Inicialmente o medicamento era recomendado pela pasta apenas para casos graves, mas o ministério ampliou a orientação em maio para todas os estágios da Covid-19 por pressão do presidente Jair Bolsonaro, um defensor do medicamento assim como o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Desde que anunciou ter testado positivo para coronavírus na semana passada, Bolsonaro afirmou que estava tomando o remédio e tem defendido o uso pelas pessoas contaminadas, mesmo reconhecendo a falta de comprovação científica de eficácia.
Nesta sexta-feira, a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) divulgou um informe em que disse ser urgente e necessário que a hidroxicloroquina seja abandonada no tratamento de qualquer fase da Covid-19, citando dois estudos internacionais divulgados nesta semana que se somaram a outros afirmando que o medicamento não é eficaz e pode provocar efeitos colaterais.
Segundo a SBI, os estudos completam a avaliação de eficácia e segurança do seu uso nas três fases da doença: profilaxia, tratamento precoce e pacientes hospitalizados, sem mostrar qualquer benefício clínico e ainda provocando eventos adversos.
“Com essas evidências científicas, a SBI acompanha a orientação que está sendo dada por todas sociedades médicas científicas dos países desenvolvidos e pela Organização Mundial de Saúde (OMS) de que a hidroxicloroquina deve ser abandonada em qualquer fase do tratamento da Covid-19”, afirmou.
A nota da SBI foi divulgada após a revelação, na véspera, de que o Ministério da Saúde enviou ofício à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) pedindo que a instituição dê ampla divulgação ao tratamento com cloroquina nos primeiros dias de sintomas de Covid-19.
A recomendação foi dada apesar de a OMS ter suspendido testes com o medicamento em vários países, inclusive o Brasil, depois que os resultados de outros estudos não mostraram benefício do medicamento contra malária para tratar a doença respiratória provocada pelo novo coronavírus.
“A Fiocruz está ciente das orientações do Ministério da Saúde sobre o uso ´off label´ (quando o fármaco é utilizado para uma indicação diferente daquela que foi autorizada pelo órgão regulatório, a Anvisa) da cloroquina e da hidroxicloroquina contra a Covid-19. A Fiocruz entende ser de competência dos médicos sua possível prescrição”, disse a Fiocruz em nota.
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