A TORTURA POR MOTIVAÇÃO POLÍTICA; Rui Leitao
A TORTURA POR MOTIVAÇÃO POLÍTICA
Sabemos que a tortura em nosso país não é só praticada por motivações políticas,como aconteceu em período recente da nossa história. Hoje ela é aplicada aos pobres em geral, aos excluídos, nas delegacias de polícia, presídios e hospícios, numa injustificada relação entre pobreza e criminalidade, compreendida pela sociedade elitista brasileira, desrespeitando os direitos constitucionais garantidos ao ser humano. A tortura ao longo de todo século XX foi utilizada contra os que eram identificados como perigosos sociais. A nossa história colonial registra esses suplícios impostos aos negros escravos e aos índios,
Porém, ao tempo em que o Brasik viveu regimes totalitários, com o sistema político se colocando como um Estado punitivo, a tortura se acentuou como ação persecutória contra grupos minoritários ou movimentos sociais que se posicionavam em campo de oposição ao governo. Durante os regimes ditatoriais da Era Vargas e após o golpe militar de 1964, a tortura tornou-se um dos mecanismos de repressão contra as pessoas consideradas subversivas, utilizados pelos agentes de Estado, sob a égide da Doutrina de Segurança Nacional, como parte da estratégia de manutenção do poder.
O regime militar instaurado em 1964 institucionalizou no país os métodos de violência física e psicológica. Os que se opunham ao sistema, dentre eles estudantes, intelectuais e engajados políticos, foram vítimas de inúmeras atrocidades. Não bastavam apenas os martírios ao corpo dos torturados, eram produzidas torturas psicológicas, imprimindo às vítimas destruição moral pela ruptura dos limites emocionais. Crianças eram obrigadas a assistir seus pais sendo torturados. Esposas se viam forçadas a incriminar seus maridos. Mulheres grávidas abortavam, por conseqüência dos suplícios a que eram submetidas. Em muitos casos, a tortura causava mortes, que procuravam disfarçar como suicídios. Corpos de torturados desapareciam após o assassinato.
Em 1979 a Lei da Anistia perdoou os torturadores que atuaram nas instituições de segurança nacional. Só a partir da Constituição de 1988 a tortura passou a ser considerada crime hediondo, não sendo permitida a sua anistia desde então. Nunca tivemos uma justiça de transição acabada. É inadmissível esse ato desumano, não só por conta da sua proibição pela Constituição, mas porque é a negação do ético, um ataque à dignidade e à liberdade do ser humano. É por definição médico-legal, um meio cruel de prática criminosa, causando padecimento à vítima, por livre deliberação do torturador. Entretanto, sistematicamente, as denúncias de torturas nunca eram consignadas aos autos das ações penais. Quando o faziam era de forma superficial, simplificada, demonstrando conivência com o comportamento criminoso dos órgãos de segurança do Estado. Os agentes que praticavam a tortura como forma de castigo, a justificavam como uma necessidade determinada por um “estado de guerra”.
Ao Estado não é delegado o poder de oprimir cidadãos por meio do uso da força. Normalizar discursos de apologia à tortura, exaltando atos violentos praticados por servidores públicos no exercício de suas funções, é algo que não pode mais ser admitido em nossa sociedade. As falas públicas de cunho antidemocrático em favor da tortura, por meio de discursos de ódio e intolerância fomentam essa prática. O Ato Institucional número 5 (AI-5), editado em dezembro de 1968, é considerado o instrumento jurídico mais atentatório às liberdades individuais e aos Direitos Humanos na nossa História.
O dia 26 de junho é datado como o Dia Internacional de Apoio às Vítimas de Tortura, instituído pela ONU – Organização das Nações Unidas, em 1997, como forma de convocar a humanidade a refletir sobre a necessidade de ações concretas de combate aos atos de tortura por parte dos órgãos repressivos do Estado. Só assim conseguiremos alcançar uma cultura de paz e justiça.
www.reporteriedoferreira.com.br/ Rui Leitão- Advogado, jornalista, poeta, escritor