A atuação dos militares fora dos quartéis Por Rui Leitao

A atuação dos militares fora dos quartéis Por Rui Leitão

Cerimônia no Quartel-General do Exército, em Brasília (Foto: José Cruz /Agência Brasil)

Ao longo da nossa história republicana percebe-se a dificuldade dos militares em compreender que são servidores públicos comuns e não agentes políticos. E essa é a razão pela qual o Brasil tem experimentado a repetição de trágicos períodos ditatoriais protagonizados por militares. As Forças Armadas, em qualquer lugar do mundo, devem assumir a competência de proteger a soberania do país, garantir a ordem pública, impedir a invasão do território nacional por estrangeiros e assegurar a integridade dos três poderes constitucionais.

Lugar de militar é no quartel e não na administração pública. Não existe o Poder Militar, à exceção da Justiça Militar, para julgar exclusivamente os crimes previstos na Carta Magna, no seu artigo 124. Fora disso qualquer comportamento tem nome: é golpe, assalto ao poder constituído, desprovido de qualquer autoridade legítima. Os saudosistas da ditadura militar continuam alimentando o delírio de que a Constituição de 1988 dá às Forças Armadas a competência de Poder Moderador. Isso é uma estapafúrdia interpretação.

O flerte com o autoritarismo que temos assistido nos anos recentes em nosso país, é a intenção de atropelar a democracia e o Estado de Direito, que a duras penas foram conseguidos e com muita intrepidez têm sido mantidos. A República foi instaurada com um golpe militar, seguidos de outros ocorridos em 1930, 1937 e 1964. Essa tradição golpista procura se firmar a qualquer custo. O relatório de investigação, dado a conhecer pela Polícia Federal, apresenta uma farta documentação probatória de crimes contra o Estado Democrático de Direito e nos dão a indicação de que estivemos muito perto de um novo golpe.

A fracassada tentativa iniciada desde o governo passado, revela, além de uma decadência intelectual, a inabilidade e despreparo para o exercício de governo em condições democráticas. Boa parte dos que integram as forças militares age conforme uma mentalidade binária e autoritária, afastada da sociedade e do povo brasileiro. Não consegue se desfazer da visão anti-comunista do período pós-guerra. Trata como inimigos todos os que se posicionam contrariamente às suas opiniões.

O livro “A Psicologia da Incompetência dos Militares”, escrito pelo psicólogo britânico Norman Dixon, descreve “as causas humanas dos desastres militares e revela o paradoxo intrigante de como as características mais desajustadas a posições de comando efetivo são, muitas vezes, exatamente as mesmas que tendem a favorecer as subidas de posto”.

O fracasso do golpe se deu, também, porque no Alto Comando das Forças Armadas prevaleceu a sensatez de oficiais comprometidos com o Estado de Direito, não apoiando as “trapalhadas” dos que articulavam a ruptura abrupta da ordem política. Eles, e aí se destacam o Comandante do Exército, General Freire Gomes, e o da Aeronáutica, Brigadeiro Baptista Júnior, entenderam que tal movimento golpista não se sustentaria sem o suporte da sociedade civil, da classe política e da comunidade internacional. Os legalistas fardados foram determinantes na inviabilidade do golpe, rejeitando embarcar numa “canoa furada”.

Rui Leitao- advogoado, jornalista, poeta, escritor